Por: Bráulio Wilker Silva


“A experiência direta é o subterfúgio, ou o esconderijo, daqueles que são desprovidos de imaginação. Os homens de ação são os escravos dos homens de entendimento. As coisas não valem senão na interpretação delas. Uns, pois, criam coisas para que os outros, transmudando-as em significação, as tornem vidas. Narrar é criar, pois viver é apenas ser vivido.”

Fernando Pessoa

O conhecimento em Administração progride com base na pesquisa científica e nas observações vindas da prática. Em outros termos, a Administração não é somente pesquisa ou somente observação. As teorias administrativas são construídas sempre associadas às observações práticas. 

A Administração, pela sua complexidade, pode ser entendida, simultaneamente, como uma ciência, uma tecnologia e uma arte.
Como ciência, a Administração é embasada em sólidos conhecimentos científicos, em métodos e teorias acerca de evidências que são criticadas, analisadas, testadas e experimentadas na prática. Em outras palavras, a prática e a observação servem de base (matéria-prima) para a formulação de teorias e conhecimentos científicos. Por outro lado, a prática é a demonstração da teoria; e a teoria é a explicação da prática. Quando a teoria diz uma coisa e a prática mostra outra, ou a prática não foi realizada conforme a teoria, ou a teoria está errada, devendo ser reformulada. Não há, portanto, qualquer conflito entre teoria e prática

As teorias, entretanto, nem sempre são embasadas apenas na prática. Muitas teorias são formuladas com base em outras teorias, o que cria novas práticas, a inovação. Uma nova teoria, portanto, cria novas práticas. Toda inovação surge primeiro na mente de seu criador, somente depois de muito trabalho é que a inovação se torna uma realidade. Um arquiteto primeiro sonha, planeja, faz esboços, desenhos… somente depois de muito trabalho é que sua criação se torna uma realidade. Inovação, portanto, não vem de músculos, mas sim do cérebro.

Os únicos seres essencialmente práticos que conheço são os animais. Os animais não fazem planejamento estratégico para os próximos cinco anos, não criam cenários para o futuro, não inovam, não são criativos. O que nos faz humanos, portanto, é a capacidade de criar, ter ideias, questionar a realidade, aprender com o passado, analisar o presente, planejar o futuro, criar literatura, arte, e ciência.


Como tecnologia, a Administração faz uso das técnicas, modelos, metodologias, práticas, ferramentas conceituais e teorias científicas para dar eficiência e eficácia às empresas e administradores. Enquanto tecnologia, a aplicação do ferramental científico deve ser mensurada em termos dos resultados gerados. A Administração enquanto tecnologia busca aplicar as teorias e conceitos científicos da Administração enquanto ciência. Em outras palavras, a Administração como tecnologia é a aplicação da ciência administrativa. 


Como arte, a Administração faz uso da intuição e da criatividade para mudar, quebrar paradigmas, inovar e transformar as empresas. Enquanto arte, a Administração usa seu arcabouço teórico e prático de forma abrangente para criar o novo. Por outro lado, a administração artística pode fazer uso de conceitos, técnicas e metodologias das demais ciências com o mesmo propósito.

Aprender com a experiência

“Há três métodos para ganhar sabedoria: primeiro, por reflexão, que é o mais nobre; segundo, por imitação, que é o mais fácil; e terceiro, por experiência, que é o mais amargo.”
Confúcio

"O tempo é um grande mestre; tem, porém o defeito de matar os seus discípulos."
Hector Berlioz

 A experiência em si não leva, necessariamente, ao aprendizado. De fato, é possível ter muitas experiências e não aprender com elas, repetindo sempre os velhos erros.  A aprendizagem ocorre quando refletimos (teorizamos) sobre nossas experiências. Esse tipo de aprendizagem é válido, entretanto leva tempo, afinal vivemos, segundo expectativas otimistas, míseros 2,5 bilhões de segundos. Nosso tempo é limitado. Peter Drucker dizia que o tempo é o único recurso que não poder ser recuperado. Ou seja, o número de experiências que podemos ter é limitado. Quanto tempo você levaria para descobrir os 118 elementos da tabela periódica sem nenhuma aula ou teoria de química? Outro problema é que as experiências são dolorosas. Imagine ter que aprender a escolher o melhor investimento para uma empresa. Entre duas opções você escolhe a primeira. Se a escolha der lucro, você fez a coisa certa; se a empresa falir, você escolheu a opção errada. Portanto, aprender pela experiência (tentativa e erro) é útil, mas leva tempo e custa caro.

Outra forma de aprender é com a experiência e conhecimento adquirido pela humanidade durante milênios. Aprender pelo estudo da história, da filosofia, das ciências e das artes é bem mais rápido e menos penoso que aprender pela experiência própria. Essa é a razão da existência da cultura. Cultura é o conjunto de conhecimentos adquiridos pelo homem e transmitidos de geração a geração, com sucessivos incrementos e transformações. Esperar que alguém aprenda por experiência própria o que a humanidade levou milênios para aprender é supervalorizar a experiência individual.

Por outro lado, o homem somente é um ser cultural por que é capaz de teorizar, analisar situações complexas, estudar o passado, compreender o presente e criar o futuro. Logo, a experiência, para ser transmitida, precisa ser teorizada. Em outras palavras, o conhecimento tácito precisa ser transformado em conhecimento explicito.

Importância da teoria

A Administração é voltada para objetivos. A aplicação de conceitos, teorias e conhecimentos científicos é que possibilita o alcance dos objetivos. Teoria e conceitos sem ação não levam a lugar algum, entretanto ação sem conceitos é alienação. 

A administração, como as demais ciências, vem incorporando as mudanças do mundo contemporâneo. Ideias como eficiência, eficácia, produtividade, lucratividade, estratégia, sustentabilidade, responsabilidade social são conceitos totalmente abstratos e intangíveis. Daí a importância da teoria para saber lidar com situações abstratas e intangíveis e criar novas situações. Basear-se apenas na experiência é manter o status quo, você sabe de onde veio, mas não sabe para aonde vai.

Diria que ações sem conceitos levam à alienação, ou seja, a pessoa faz algo que é sem sentido para ela. “Por que você está fazendo isso?” “ Ah, porque o patrão mandou!” Em outras palavras, sem teoria, as pessoas desempenham funções sem saber o porquê, sem entender a importância de sua tarefa para a empresa e para a sociedade como um todo.

Uma teoria nunca é uma verdade acabada e definitiva. Uma vez aplicada à prática, estará sujeita a reelaborações e reestruturações vindas da crítica e experiência. As teorias são reformuladas, redefinidas, o que gera novas ideias. Em outras palavras, a teoria é um ponto de partida para se chegar a patamares mais elevados, ou seja, para inovar.

Conforme Chiavenato:

“O administrador não pode se limitar a um pragmatismo superficial e ao desprezo pelo conhecimento. Para tanto, deve pensar, refletir sobre sua própria realidade, agitar ideias, plantar indagações, problemas e questões ou buscar teorias gerais que o ajudem a desenvolver conceitos e modelos capazes de proporcionar sucesso na profissão. Sobretudo refletir sobre sua realidade no sentido de transformá-la continuamente. Para melhor! O administrador precisa ser um agente ativo e proativo na transformação social de nossas organizações. Todo administrador busca resultados, mas sem a teoria adequada para chegar lá será apenas um palpiteiro ou chutador às cegas. Teorias científicas são declarações que predizem como o mundo real vai responder quando provocado de certa maneira. E o que afirma ou nega qualquer teoria é a resposta que o mundo dá a ela.”

Não há, portanto, dicotomia entre teoria e prática. A relação da teoria com a prática é sinérgica, ou seja, uma potencializa a outra.